Diretor de World of Warcraft fala sobre recomeço do MMO com Dragonflight
Em entrevista ao Flow Games, Ion Hazzikostas compartilha aprendizados e estratégia da Blizzard com Dragonflight
pesar de ter passado por momentos turbulentos – com episódios ligados à cultura do estúdio, deslizes com Overwatch, polêmicas em torno de Diablo Immortal e todo imbróglio em relação à compra pela Microsoft –, World of Warcraft Dragonflight parece ser a vitória que a Blizzard tanto precisava para retornar aos holofotes de forma positiva.
Isso porque Dragonflight marca uma volta em grande estilo a Azeroth e parece ter sido capaz não só de reconquistar veteranos e atrair novatos, como também apagar os tropeços com Battle for Azeroth – e parte de Shadowlands – e revitalizar um MMO que vai chegar aos 20 anos em 2024.
Muito disso se deve ao fato de o time por trás do game ter apostado numa estratégia diferente da que vinha usando até então, encabeçada por pilares de transparência com a comunidade e muito conteúdo sendo adicionado continuamente à jogatina.
Foram justamente esses dois fatores que permitiram que o Flow Games pudesse entrevistar na última semana Ion Hazzikostas, diretor de World of Warcraft. No papo com o líder da equipe de Dragonflight, abordamos os sucessos e aprendizados com a expansão, o momento do jogo e o que vem por aí no MMORPG icônico.
Dragonflight: um recomeço para World of Warcraft
Após a apresentação antecipada da cinematic do patch 10.0.7 de Dragonflight e a revelação de detalhes do pacote de conteúdo 10.1 (Brasas de Neltharion), pudemos falar com o diretor junto de um grupo seleto de veículos de imprensa.
Você pode conferir neste link os detalhes gerais de ambas as atualizações – que estão recheadas de novidades e chegam muito em breve a Dragonflight – e ler a seguir os destaques da conversa do Flow Games com o executivo da Blizzard:
Flow Games: Ion, muito obrigado por nos receber para esse papo. Para começar, acho que podemos falar sobre Aberrus, o Crisol Sombrio. Qual é a ideia por trás desta nova raide, que é um dos pilares do patch 10.1 de Dragonflight?
Ion Hazzikostas: As inspirações para essa raide vieram lá de trás, de Blackwing Lair (Vanilla/Classic) e Blackwing Descent (Cataclysm), no sentido de “vimos as experimentações de Nefarian, filho de Neltharion, mas agora vamos conferir onde tudo começou”. Revisitar esse tema novamente após uma década e ampliar o escopo de tudo, tornando tudo ainda mais épico, foi o objetivo do time com Aberrus.
Também há um aspecto interessante de que o chefe final da raide não será um dos Encarnados recém-libertados por Raszageth antes de sua morte, mas sim um Dracthyr, o Comandante-de-escama Sarkareth – um líder da facção rival de seus aliados nas Ilhas do Dragão que está tentando retomar o legado de sua raça.
FG: Em relação à raide de estreia de Dragonflight, que aprendizados vocês tiveram, como foi a resposta do público até agora e como foi a transição para Aberrus? Sentiram que a dificuldade da primeira raide pode ter sido alta demais?
IH: De forma geral, ficamos bastante felizes com a Câmara dos Encarnados em termos de experiência, ambientação, o número de encontros que estão integrados de alguma forma com o cenário e a forma como você enfrenta os bosses de maneiras únicas. É uma jornada épica por um local importante para a história de Dragonflight.
Dito isso, balanceamento é algo que podia ser melhorado e já fizemos alguns ajustes em patches recentes em encontros como o da Raszageth [boss final de Câmara dos Encarnados]. O montante de responsabilidade individual e coordenação do grupo necessário para alguns desses encontros, mesmo em dificuldades mais baixas, estava em um ponto que causava frustração em alguns grupos – ainda mais quando o erro de um único jogador podia pôr tudo a perder para os outros.
Queremos reservar esse tipo de coisa para a dificuldade Mítica, na qual os players sabem o que os espera e entendem que vão ter que não só jogar muito bem, mas gastar tempo para aprender cada fase e mecânica da luta – ganhando loots melhores como recompensa.
Então, em termos de balanceamento, é algo que queremos acertar melhor em Aberrus, mas no que diz respeito a ambientação e tema, vamos pegar a experiência épica que você viu na Câmara dos Encarnados e elevar à décima potência.
FG: Falando das mudanças drásticas trazidas por Dragonflight, é inegável que o sistema de profissões é um dos que mais mudou com a chegada da expansão. Vocês sentem que essa parte de crafting pode ter ficado complexa demais para jogadores mais casuais? Há espaço para melhorar?
IH: O sistema de profissões de Dragonflight não é perfeito, mas consideramos um sucesso a forma como esse “experimento” está se desenrolando. Afinal, trata-se de um redesign bem ambicioso com o qual tentamos simultaneamente fazer duas coisas:
1) Adicionar uma tremenda profundidade para jogadores que quisessem mergulhar fundo e se focar nas profissões, brincando com a economia e com o mercado do jogo, e suprindo as necessidades do servidor. A ideia aqui era resgatar um pouco daquela aura dos crafters que se tornaram famosos em seu servidor no Vanilla [WoW pré-expansões] por fazer aquele item específico e de difícil obtenção.
Era preciso haver essa profundidade para que as pessoas se diferenciassem umas das outras. Quando o trabalho se resume a um clique de um botão e qualquer um pode clicar nesse botão, não há espaço para aquele tempero especial que faz alguém se sentir diferente por ter investido mais naquela profissão.
Era preciso haver essa profundidade para que as pessoas se diferenciassem umas das outras.
2) Ao mesmo tempo, queríamos incentivar um número ainda maior de jogadores a interagir com a economia de crafting. Acho que com sistemas como os de ingredientes vinculados, Ordens de Serviço e outros, atingimos esse objetivo.
E tudo bem que algumas pessoas não queiram se tornar crafters – não é algo para todo mundo –, essas são aquelas que olham para os ingredientes necessários e esforços para subir uma profissão e pensam: “quer saber, vou juntar ouro de outra maneira e deixar outra pessoa fazer isso tranquilamente pra mim”. Isso também é necessário para que uma economia funcione de forma saudável num MMO.
Então, de uma forma geral, estamos bem felizes com esses dois pontos. Acho que podemos melhorar mais em questões de tutorialização e balanceamento de sistemas, além de reforçar a ideia de que nem todas as profissões precisam ter o mesmo grau de complexidade.
Enquanto parte dos jogadores quer se tornar o melhor profissional de um tipo específico de equipamento, algo que exige uma grande dedicação, outros só querem fazer algumas poções para distribuir para os companheiros de raide – e isso tem que ser bastante acessível. Vamos aprimorar tudo isso com a chegada de mais receitas para as profissões.
FG: Uma das coisas que mais nos chamou atenção nessa revelação do patch 10.1 foi a adição de um sistema de guildas cross-faction ao jogo. Vocês entenderam que esse era um próximo passo natural para a crescente interação entre jogadores da Horda e Aliança? É uma tentativa de resgatar o valor das guildas para a comunidade? O que vem depois?
IH: Guildas são um dos pilares sociais de World of Warcraft e queremos que os jogadores continuem a poder achar um grupo de pessoas que compartilhem dos mesmos interesses, tipo de abordagem do jogo e personalidade que eles. Sim, WoW também dá suporte a jornadas solo, mas tudo fica mais divertido quando é vivido e experimentado com pessoas que gosta – e isso vale tanto para os games em geral quanto para a vida.
Quando falamos da possibilidade de termos guildas cross-faction em Dragonflight, que é algo que chega no 10.1, vejo como um próximo passo do que começamos a fazer com instâncias/raides cross-factions no final de Shadowlands. Também é uma resposta direta ao feedback que recebemos dos próprios jogadores desde que iniciamos essa possibilidade de jogatina mista entre Horda e Aliança.
Vimos muitas pessoas mudando de “lado” para finalmente poder jogar com a facção ou raça que elas sempre quiseram, mas ainda podendo jogar com seus amigos que ficaram no outro time. Não demorou, no entanto, para que eles comentassem que essa mudança impedia que eles estivessem na mesma guilda de antes.
O impacto disso é que esses jogadores não podiam mais estar no seu antigo chat da guilda ou se beneficiar dos serviços de reparo de equipamentos ou, ainda, acessar o banco do grupo. Isso tudo era não só muito inconveniente, como também os fazia se sentir frustrados. Eles perguntavam: nós somos todos amigos e já estamos jogando juntos, então por que não podemos estar na mesma guilda?
Somos todos amigos e já estamos jogando juntos, então por que não podemos estar na mesma guilda?
É exatamente isso que estamos remediando agora. Ainda temos uma abordagem conservadora [em relação a cross-faction] porque sabemos que é algo que nunca poderemos voltar atrás – não vamos simplesmente dizer que você não vai poder mais jogar com seus amigos – e porque queremos manter a importância e a fantasia de Horda e Aliança como facções relevantes dentro do universo de Warcraft.
Se chegássemos a um ponto em que nos desfizéssemos completamente das duas facções ou em que elas não importam mais, acho que seria algo prejudicial para a franquia. Ainda não tenho nada para compartilhar em relação aos próximos passos disso, mas estamos sempre ouvindo os anseios da comunidade e queremos dar o máximo de opções para que os players possam jogar junto de pessoas queridas.
FG: Pela primeira vez em muito tempo vocês se arriscaram em soltar um cronograma para o futuro próximo de World of Warcraft após o lançamento de Dragonflight. Por que resolveram fazer isso? É uma tentativa de ser mais transparente com a comunidade ou um sinal de confiança na capacidade de produção de conteúdo da equipe?
IH: A verdade é que o time está muito confiante no caminho escolhido para Dragonflight. Quando criamos o projeto, sabíamos que gostaríamos que os jogadores se juntassem a nós não só no lançamento, mas no decorrer de toda a expansão. Queríamos que todos soubessem o quão ambiciosos estamos sendo e o que espera por eles caso eles decidam nos acompanhar nessa jornada.
Mas é algo diferente do que fizemos no passado. Até então, os jogadores esperavam o padrão de alguns patches grandes e, quem sabe, alguns updates “.5” [atualizações menores] no meio do caminho. A ideia de termos novos conteúdos chegando a cada poucos meses é algo novo, então tínhamos que ser transparentes em relação aos nossos objetivos.
Transparência é, com certeza, algo que nos motiva aqui. No passado, a Blizzard sempre teve esse modo mais fechado e conservador na hora de compartilhar datas de lançamento específicas. Não era maldade, mas sim o desejo de saber que podíamos nos dar o tempo necessário para criar algo excelente e que não desapontasse nossa comunidade.
Porém, percebemos que manter o público no escuro a respeito dos nossos planos [para a expansão] é algo prejudicial. Se quisermos garantir que nunca vamos perder um prazo, é mais fácil nunca compartilharmos uma data, não é? Não acho que isso funcione no interesse dos jogadores a longo prazo.
Por isso, sugeri que tentássemos essa nova abordagem e, sendo bastante honesto, pode ter coisas que estavam no roadmap deste ano, por exemplo, que acabem não sendo implementadas exatamente do jeito ou na data que planejamos – porque faz mais sentido que ela chegue em outro momento ou acabe sendo reformulada.
Se um dia isso vier a acontecer – e estamos trabalhando para que não aconteça –, tenho certeza de que algumas pessoas vão ficar desapontadas, mas nosso entendimento é que essa vai ser a exceção à regra. Podermos “hypar” os jogadores e contar um pouco mais da jornada à frente deles é algo que vale esse risco, e estamos contentes com o resultado dessa estratégia até agora.
FG: Por fim, esta é uma boa hora para retornar a World of Warcraft ou fazer sua estreia no MMO com Dragonflight? Ninguém vai se sentir perdido com esse tanto de conteúdo programado para o game?
IH: Acho que esse é um momento maravilhoso para voltar para WoW ou experimentá-lo pela primeira vez. Essa expansão foi desenvolvida para ser um sopro de ar fresco e um novo começo para o jogo.
Amarramos boa parte das storylines na última expansão (Shadowlands), então você não precisa saber muito do lore dos últimos anos para se envolver na nova história. Também é uma temática muito acessível de dragões, o despertar de Azeroth, a terra precisando da nossa ajuda e exploração. O restante vai sendo contado conforme você progride.
Temos uma experiência mais simples para novos jogadores que foi implementada em Battle for Azeroth e os coloca direto no caminho para Dragonflight. A partir daí, você rapidamente desbloqueia a Dragonaria e pode voar pelos céus das Ilhas do Dragão.
Em relação aos veteranos, ouvimos muitas histórias de gente que não joga WoW há algum tempo – ou que estava apenas no Classic – chegando para dar “apenas uma olhadinha” em todo esse hype em torno da nova expansão e ficaram surpreendidos, gastando mais tempo do que esperavam em Dragonflight.
Nunca houve um momento melhor para jogar World of Warcraft.
Por conta disso, encorajo qualquer um que esteja pensando em voltar ou experimentar o jogo a mergulhar em Dragonflight. Nunca houve um momento melhor para jogar World of Warcraft: afinal, não é preciso se preocupar em ficar perdido ou para trás, tudo estará lá para você quando você estiver pronto, no seu tempo.
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