Ruff Ghanor: entrevistamos Jovem Nerd, Azaghal e os devs do jogo
O Flow Games conversou com os criadores e os desenvolvedores de Ruff Ghanor e conta tudo para você
urante a Brasil Game Show 2023, pudemos não apenas mergulhar numa verdadeira sessão de degustação com Ruff Ghanor, mas também bater um papo com os criadores desse deckbuilder roguelite 100% brasileiro para entender mais sobre as origens do projeto, qual é a grande estratégia com o game e o que fãs (e novatos) podem esperar da jogatina.
No evento, conversamos tanto com Alexandre Ottoni (Jovem Nerd) e Deive Pazos (Azaghal), cofundadores do Jovem Nerd, quanto com Orlando Fonseca Jr., diretor de desenvolvimento do jogo na DX Gameworks. Bora conferir os melhores momentos dessas entrevistas? Então, vem com a gente!
A jornada de Ruff Ghanor
Muito antes de chegar ao mundinho dos games, a marca Ruff Ghanor já tem uma trajetória de mais de dez anos de sucessos. O personagem-titular, um jovem clérigo destinado a enfrentar o tirânico dragão vermelho Zamir, por exemplo, nasceu no primeiro episódio de RPG do Nerdcast, um dos primeiros e mais populares podcasts do país.
Desde então, o passado do herói lendário foi explorado numa trilogia de livros escritos por Leonel Caldela – autor de diversos romances de Tormenta, da Jambô Editora – e vem sendo desmembrado para outras mídias e produtos, como audiolivros, graphic novels, livros-jogo e até mesmo uma nova série do Nerdcast RPG.
No início de outubro, a equipe por trás da IP foi buscar na comunidade uma forma de viabilizar ainda mais projetos e, principalmente, um RPG propriamente dito de Ghanor. Intitulado Tesouros de Ghanor, o financiamento coletivo que vai até 10 de novembro tinha uma meta inicial de R$ 500 mil e, até agora, já arrecadou quase R$ 6 milhões – mostrando a força da franquia junto ao público.
Por conta disso, o anúncio do jogo de Ruff Ghanor na BGS 2022, a demonstração oferecida aos visitantes do evento este ano e o iminente lançamento do produto – planejado para o início de 2024 – fazem com que essa estreia do império Jovem Nerd nos games aproveite um momento bastante especial para a marca.
O papo com os criadores
Para Alexandre Ottoni, o processo de adaptação da história do primeiro livro de “A Lenda de Ruff Ghanor” para um jogo foi bem interessante por diversos motivos. “Para começar, trata-se de um arco bem fechadinho que é a típica história de games: um jovem que cresce, evolui e enfrenta o dragão vermelho Zamir. Aqui, você treina, ganha poder, sobe de nível e enfrenta um boss final sinistro”, explica.
Trata-se de um arco bem fechadinho que é a típica história de games: um jovem que cresce, evolui e enfrenta o dragão vermelho Zamir.
Encontrar bons parceiros para essa jornada também foi essencial na visão do empresário e criador de conteúdo. “Foi muito legal ver como os desenvolvedores [da DX Gameworks] já eram muito fãs da obra, então facilitou muito o trabalho de transposição do material original”, analisa o Jovem Nerd.
“Eu sou fã deles de longa data e boa parte da equipe já conhecia o Jovem Nerd, leu todos os livros e é apaixonada pelos Nerdcasts de RPG. Então, na hora que chegou essa proposta pra gente, teve aquele negócio de já gostarmos muito do trabalho dos caras e estarmos familiarizados com o universo deles”, adiciona Orlando Fonseca Jr., da DX Gameworks.
No papo, Ottoni e Pazos também contaram ao Flow Games como, apesar de estarem sempre envolvidos em tudo que se refere às suas marcas e propriedades intelectuais, dão liberdade o suficiente para que o trabalho com parceiros seja algo colaborativo e criativamente rico para ambas as partes.
Tudo a 4 mãos (ou mais)
“A gente está envolvido em tudo, sempre. Nos livros do Leonel, a gente participou do briefing, leu o livro e fez a função de editor de certa forma. Com a DX, toda parte de adaptação e desenvolvimento, decisões de mecânica, regras e design contou com a nossa participação”, explica Deive Pazos.
Azaghal ainda mergulha um pouco mais no assunto, afirmando que a presença deles é mais para garantir que o público tenha algo coeso do que para controlar cada minúcia do projeto. “Delegamos muita coisa, a ideia é que cada um coloque a sua expertise em prática. É um papel muito próximo ao de um showrunner de uma série, por exemplo, com a gente supervisionando cada etapa”, analisa.
“Um exemplo prático: a primeira coisa que o Leonel escreveu para a gente foi justamente esse livro da Lenda de Ruff Ghanor que está servindo de base para o game”, recorda Alottoni.
“Na época, a gente tinha o Nerdcast RPG como uma base e queríamos contar uma história nova. No podcast original, o Ruff Ghanor era só um mito, uma lenda que morreu há muito tempo e cujos itens mágicos foram usados pelos jogadores. E aí a gente perguntou, ‘Leonel, onde você enxerga uma história aqui? Será que podemos contar a história desse cara?'”, brinca.
“Aí o Leonel foi pensar e voltou pra gente com um argumento inicial e a gente achou incrível. Na nossa cabeça, o cara era um herói boladão. Mas como será que ele era na verdade? Quem era o homem por trás da lenda? Foi esse gancho que conquistou a gente”, complementa.
Nesse sentido, a estratégia de Alottoni e Pazos é muito mais a de habilitar seus colaboradores do que podar ideias, até mesmo para evitar que eles se sintam restringidos demais para pensar em coisas diferentes, que enriqueçam ainda mais o mundo da obra ou levem a história para novos caminhos.
“Teve coisa que o Leonel fez, por exemplo, que o Azaghal viu e falou assim: ‘não, não, não, vamos ser ousados e vamos por esse caminho, sem medo’. As pessoas com quem a gente trabalha têm muita experiência, trouxeram riqueza ao material e, mais importante do que tudo, são pessoas que sabem criar uma dinâmica legal de colaboração”, diz o Jovem Nerd.
“Damos bastante liberdade com a nossa postura sendo mais de: vamos mais, vamos mais”, acrescenta Azaghal. “Então, quando conseguimos achar essas pessoas e ter essa fluidez de ouvir, adaptar e oferecer – isso das duas partes – acaba se criando uma relação de criação muito ideal pra gente”.
O diretor da DX Gameworks compartilha da visão da dupla. “Trabalhar com os dois foi maravilhoso, porque eles têm um cuidado muito grande com as IPs que eles criam e esse zelo é muito importante para a gente e para o nosso dia a dia com a obra: a gente sabe até onde pode ir, do que a gente desvia e, principalmente, o que é preciso adaptar”, afirma Fonseca Jr.
Para o dev, essa dinâmica é essencial na hora de transferir elementos de uma mídia para a outra. Algumas coisas que a equipe da DX queria adicionar à jogatina, por exemplo, mas seriam incompatíveis com o universo da série, enquanto outras que estavam na literatura poderiam destoar, ficar desinteressantes ou perder o elemento de interatividade no game.
“Durante o desenvolvimento, entendemos que não tem problema se algo ficar só nos livros, porque tem outras coisas que podemos expandir num jogo, como personagens novos que caibam dentro da história e desse universo. É algo que até foi bastante incentivado que fizéssemos”, comenta.
“No final das contas, sempre trabalhamos juntos, testando tudo e com eles trazem muito feedback valioso, porque os dois também são gamers, também conhecem cardgames. Então, foi realmente fantástico”, define o líder do projeto.
Deckbuilder? Roguelite?
Antes mesmo de colocarmos as mãos no jogo para produzir o preview oficial de Ruff Ghanor aqui no Flow Games, ficamos curiosos com o fato de Alottoni, Pazos e o time da DX Gameworks ter escolhido um deckbuilder roguelite como o combo ideal de gêneros para adaptar uma história dos livros para os games.
Parece uma escolha realmente inusitada, mas há motivos para que a combinação funcione. “Quando a gente começou a conversar, fizemos algumas propostas diferentes de jogos, não só para Ruff Ghanor, mas para diversas das propriedades intelectuais que eles tinham. Quando ficou definido que seria Ghanor, pensamos que seria algo que se encaixaria muito bem com um deckbuilder”, revela Fonseca Jr.
“Até chegamos a explorar outras ideias, como um RPG de ação ou coisas do tipo, que seriam mais óbvias para uma IP como essa. Optar por um card game, no entanto, permitiu não só que a gente mantivesse o escopo sob controle como também que entregássemos uma mistura interessante de lore e gameplay”, adiciona.
Até chegamos a explorar outras ideias, como um RPG de ação ou coisas do tipo, que seriam mais óbvias para uma IP como essa.
Para o Jovem Nerd, isso permitiu integrar temática e mecânica de um jeito simples, imersivo e divertido. “Você tem o seu deck com atributos de defesa, ataque, buffs etc, mas como o Ruff é um clérigo, tem também poderes divinos representados por meio de uma árvore de milagres que criamos, que possui outra moeda, a Fé”, conta Alottoni empolgado.
“Os Milagres são como os Ults (Ultimates) de outros jogos, que podem dar dano em todos inimigos, curar todo mundo, dar armadura para proteger o grupo de um superataque e outros efeitos. Pensamos em um monte de mecânicas diferentes dessas magias e, muitas vezes, ela são tudo que existe para salvar a sua pele”, brinca.
“Uma parte interessante é que você joga com outros personagens ao mesmo tempo e literalmente aprende com eles por meio de um sistema que retém algumas das cartas desses aliados”, explica Pazos, mostrando como isso ajuda a contar, em termos de gameplay, um pouco da mesma jornada encarada por Ruff Ghanor nos livros.
Com tudo isso em mãos, Alottoni acredita que é possível atrair quem busca uma trama legal, mas, ao mesmo tempo, despertar o interesse de quem está aqui pelo estilo de jogo. “Queremos dar liberdade para que o jogador decida sua estratégia e como quer jogar: seja um Ruff só de ataque e porradeiro ou construindo um deck totalmente de controle, focado em curas, buffs e debuffs”, diz ao Flow Games.
Indo além da bolha
Esses aspectos de história original, jogabilidade familiar e a combinação de ambos é essencial para que Ruff Ghanor possa atingir não apenas o público massivo que já conhece o personagem e sua aventura dos podcasts, livros e quadrinhos, mas também de uma audiência completamente nova e que, acredite, não necessariamente brasileira.
“Nos concentramos muito em adaptar a história de uma forma que ela fosse compreensível para qualquer pessoa, mesmo porque o jogo vai lançar simultaneamente em todo o mundo. Vai chegar em inglês lá fora onde ninguém sabe quem é Jovem Nerd nem nada do tipo, então a gente tem que saber entregar um jogo que seja uma experiência completa para todo mundo”, decreta Alottoni.
Ele cita o caso de Ozob, outro personagem da casa, para exemplificar essa meta ousada com Ruff Ghanor. “O personagem do Azaghal acabou simplesmente indo parar em Cyberpunk 2077. Os próprios gringos viram a arte do Ozob, acharam interessante, tentaram entender o que era aquilo e aí a galera que acompanha o Jovem Nerd foi lá em peso educar os caras”, relembra.
“Rolou um momento muito legal de engajamento para o nosso público, que viu os caras lá fora encontrando pela primeira vez algo que eles já conheciam há tempos. Esse é o tipo de impacto que queremos com o Ruff, com nossa audiência sendo uma base de credibilidade que ateste que se trata de algo legal mesmo”, afirma o Jovem Nerd.
“Queremos que ele também chegue num público que hoje não faz parte da nossa audiência, o cara que gosta de games e nunca ouviu falar de Ruff Ghanor, Jovem Nerd ou até mesmo desse tipo de jogo, mas gosta da estética, por exemplo, e acaba chegando no nosso game”, acrescenta Pazos.
O diretor do jogo acredita que esse foi o maior desafio no desenvolvimento do jogo, ainda mais porque é preciso entregar um produto que faça sentido tanto para o fã – que vai jogar já entendo e sabendo quem são os personagens, o cenário e tudo mais – quanto para quem não tem nenhum conhecimento prévio da obra ou do ecossistema em que ela está inserida.
“Isso, inclusive, casa com um dos grandes objetivos do projeto: ser um jogo que funcione até mesmo fora do Brasil. Lá fora, o alcance da obra original é bem menor – os livros da série nunca foram lançados em outro idioma, por exemplo. Quem curtiu Slay the Spire pode chegar atraído pela temática e acabar se envolvendo com um universo completamente novo para ele”, afirma o representante da DX Gameworks.
O momento ideal para Ruff Ghanor
Com um ano entre o anúncio oficial do game e a entrega de um material quase finalizado na BGS 2023, dá para afirmar que todos os envolvidos deram seu máximo para que tudo ocorresse não só a tempo da feira, mas também da melhor forma possível.
Afinal, a marca Ruff Ghanor parece viver seu melhor momento e atingiu uma massa crítica, pelo menos localmente, no que diz respeito a olhos voltados para si entre o público aficionado por cultura pop e o mercado geek em geral.
“Só conseguimos isso porque nossa equipe é maravilhosa e deu os passos certos para que tivéssemos animações espetaculares, arte de alta qualidade e algo que fosse muito atrativo para os gamers”, conta Fonseca Jr.
“A nossa equipe tem mais de 40 pessoas. Obviamente, algumas delas estão mais fixas no projeto enquanto outras, como ilustradores, são trazidos com frequência pra nos ajudar nas cartas, relíquias, cenários e tudo mais. Mesmo assim, foi um desafio gigante conseguir cumprir esse prazo de ter o jogo num estágio pronto para ser trazido aqui e mostrado pra todo mundo”, complementa.
O desenvolvedor também ressaltou a importância de estar numa feira como a BGS e da oportunidade de colocar a jogatina nas mãos de tantas pessoas.
“Ficamos sempre muito ansiosos porque existem muitas coisas que a gente, internamente, assume que vão ser verdade enquanto estamos desenvolvendo o jogo. E aí, quando colocamos o jogo nas mãos do jogador, pode acontecer exatamente aquilo que a gente achava que ia acontecer ou coisas completamente inesperadas”, conta.
“Seja como for, é fantástico poder ver a reação ao game, que tem sido bastante positiva. É fantástico ver as pessoas conseguindo entender o que é cardgame, a sinergia entre as cartas e, claro, percebendo que há tanto elementos de combate quanto de narrativa. É realmente um combustível para que a gente possa finalizar o jogo e pensar em ainda mais coisa e conteúdo para o futuro do projeto”, comenta o diretor do jogo.
E o futuro?
Tudo nessa jornada de desenvolvimento do primeiro game de Ruff Ghanor é algo que carrega peso e significado para seus criadores. Afinal, para eles, trata-se de uma expansão inédita de um universo originado no primeiro Nerdcast RPG.
“Honestamente, é muito simbólico estarmos retomando e expandindo esse universo agora, pouco mais de 10 anos após sua criação e tendo a chance de atingir públicos que nunca ouviram falar da gente, então estamos muito empolgados”, comenta Alottoni.
Dependendo do sucesso do game ou do financiamento coletivo, há espaço para expandir ainda mais a marca? “Tudo é sonhos e possibilidades. Estamos dando um passo de cada vez. A gente vê que, com toda certeza, existe potencial grande nessa e em outras das nossas histórias”, explica o Jovem Nerd.
“Eu mostrei o Ozob pro Ridley Scott numa entrevista, por exemplo, e ele ficou ‘nossa, que parada legal’. Então, sim, entendemos que podemos refinar ainda mais nossos produtos para que eles possam chegar a ainda mais pessoas”, acredita.
“Mas respondendo à sua pergunta, sim, temos planos pra tudo: séries, filmes, animações e o que mais for possível”, finaliza Pazos.
Fique de olho em Ruff Ghanor
Por mais que tudo esteja nos trinques, a verdade é que Ruff Ghanor ainda não tem uma data de lançamento. Mas não precisa ficar chateado, uma vez que, segundo os criadores da obra original e o estúdio por trás do game, o jogo deve chegar no início de 2024 para virtualmente todas as plataformas: PlayStation, Xbox, Nintendo Switch e PC.
Até lá, você pode mostrar seu interesse pelo produto colocando Ruff Ghanor na sua Lista de Desejos da Steam ou do site da Nuuvem. Nesta segunda loja, o título já está em pré-venda com um desconto de 14%, pelo valor de R$ 47,99.
Comentários
Muito interessante o projeto. Infelizmente trata-se de um produto para um nicho específico, e dificilmente ganhará alguma notoriedade internacional, entretanto, toda notícia envolvendo o desenvolvimento de games por estúdio brasileiros, é sempre bem vinda.