Da EVO para a SNK! Kane Blueriver fala sobre o passado, presente e futuro
De campeão da EVO para a Divisão de Negócios Ocidentais da SNK, Nicolas Gonzalez conversa sobre a FGC
e você conhece a história do Flow e do Flow Games, deve saber que The King of Fighters é uma franquia essencial para a gente. Afinal, o nosso Igor3K é apaixonado pelo KOfzinho.
Quando soubemos que a SNK marcaria presença na feira BGS 2023 muito bem representada por Nicolas Gonzalez, da sua Divisão de Negócios Ocidentais, simplesmente tivemos que marcar uma conversa com essa lenda.
Se você não conhece o nome dessa fera chilena, talvez o conheça como Kane Blueriver, campeão de Ultimate Marvel vs Capcom 3 na EVO Japan 2019. Veja como foi o nosso papo (e também a minha foto de fã porque ninguém é de ferro) sobre a FGC e SNK a seguir!
Como Kane Blueriver foi parar na SNK
Flow Games: É uma honra conversar com um ícone da FGC e um dos melhores lutadores sul-americanos, parabéns pelo trampo na SNK! Como foi a sua trajetória e passagem de jogador profissional para trabalhar diretamente com os caras da SNK?
Nicolas Gonzalez: Eu não me considero um jogador profissional porque, apesar de ter conseguido bons resultados, o profissional, na minha opinião, precisa conseguir sobreviver diretamente com os frutos do seu trabalho, e isso nunca foi o caso para mim.
Tenho certeza de que muita gente da FGC, não só no Brasil, passou pela mesma coisa. É muito difícil. Mesmo sendo o melhor do mundo em Marvel Vs Capcom 3, oportunidades maiores nunca vieram, o que me desapontou muito.
É difícil me considerar um jogador profissional por isso, eu não me vejo assim. Muita coisa mudou com o tempo, mas eu nunca planejei parar de jogar. Mas ser o melhor no seu bairro, cidade ou região pode não levar a nada, e isso é embaçado.
Nos últimos cinco ou seis anos não me foquei tanto mais no lado competitivo da coisa. Eu costumava passar meses nos EUA e Japão só para treinar com os melhores, mas quase todos os torneios migraram para o online durante a pandemia.
Entre março e a EVO costumávamos ter grandes torneios mensais, eu queria competir, mas não tinha os meios para fazer isso. Então trabalhar com a SNK não era algo que eu mirava, mas foi uma boa oportunidade que surgiu no caminho.
Muita gente luta bem mas não se preocupa tanto com o networking. Isso para mim era prioridade, porque isso me ajudou muito como competidor. Sentar e conversar com as pessoas, fazer novos contatos, tudo me ajudou a ter oportunidades em torneios de lugares distantes.
Isso era possível não pelos meus resultados, mas sim graças aos meus amigos e contatos que ajudavam. E isso me colocou em uma posição boa entre líderes de comunidade, jogadores, organizadores de torneio, até conhecer o pessoal da SNK.
Antes mesmo do trabalho oficial, ajudei os caras com trilha sonora e localização, além da logística de torneios com jogadores da América Latina. Os japoneses não entendiam tão bem como a nossa logística de viagens era diferente da deles.
Só de virmos da América Latina já temos algumas habilidades de solução de problemas que eles valorizam. As coisas não costumam dar certo de cara aqui, então todos nós somos bons em algum nível na hora de criar soluções para emergências e problemas em andamento.
Tudo funciona muito bem no Japão 99% do tempo, mas nas raras ocasiões em que isso não acontece, em que algo trava ou dá errado, é aí que eu entro, e nos damos muito bem (risos).
É legal você ter comentado isso dos perrengues na América do Sul, porque quando conversei com os brasileiros que foram para a EVO 2023, eles me contaram algo parecido. É bom saber que a SNK está vindo para o Battle Coliseum aqui no Brasil em novembro.
Todo mundo sabe que o Brasil é uma das regiões mais fortes do mundo para a FGC, mas ele também é um ponto estratégico. Há muitos competidores fortes no Peru, Chile, Argentina e Colômbia.
Então eu tenho certeza de que muita gente ainda vai vir para cá para lutar. Com certeza será uma ótima demonstração de como está o nível por aqui. E, em um nível pessoal, sinto que será uma grande reunião entre amigos também.
Será o primeiro grande torneio pós-COVID com premiação na região, e isso deve motivar muita gente a vir aqui jogar. Vai ser uma grande celebração de amigos se reencontrando depois de tanto tempo. Para mim, como jogador, isso é algo que significa muito!
E vale uma vaga para o campeonato mundial, e todo mundo quer ter a sua oportunidade de brilhar em nível global, certo? Eu farei absolutamente tudo no meu poder para que o vencedor possa ir ao torneio presencialmente.
É claro que o voo é pago para o vencedor, mas tem todo o lance da emissão de vistos também, os trâmites para a viagem… o local ainda nem foi decidido, mas independente de onde for, farei de tudo para ajudar a pessoa a chegar lá na melhor condição possível.
Valeu mesmo por isso! Agora que cobrimos as partidas presenciais, e o online, hein? A SNK está vendo com bons olhos o crossplay e, especialmente, a implementação de rollback nos seus jogos futuros?
Rollback é uma necessidade básica em qualquer jogo de luta hoje. Se o seu jogo não tiver rollback para o online, esquece, ele não existe. KOF XV já foi lançado com rollback, então eu espero que City of the Wolves siga o mesmo caminho.
Não faz muito tempo que trouxemos o crossplay também para KOF XV, então eu imagino que eles vão usar as informações e aprendizado disso, o quanto ele foi usado ou não, para aí decidir o que e como fazer no City of the Wolves.
Eu estou bem empolgado para esse City of Wolves, hein? Entre nós, tem alguma trivia ou curiosidade legal que você já possa compartilhar com a gente sobre ele direto dos bastidores da SNK?
Claro! No Japão, os jogos de Fatal Fury são chamados de Garou Densetsu, mas Mark of the Wolves se chama apenas Garou. Porque não é uma lenda (o tal “densetsu”, em japonês), mas sim o que está acontecendo agora mesmo, e não uma história do passado.
Então como você pode ver, o título é Fatal Fury City of the Wolves, e isso acontece porque, mais do que a história dos personagens, essa é a história de South Town, ou melhor, da Second South Town.
Você pode ver, especialmente no trailer que mostramos na EVO este ano, que a cidade exercerá um grande papel no jogo. Vemos várias locações e lutadores. Só pelas vozes você já faz uma ideia de quem está lutando por lá, só que nem todas elas são de Mark of the Wolves.
São personagens que têm influência na história de South Town. Acredito que essa relação entre passado, presente e futuro vai ser um dos pontos mais interessantes do jogo. Vai ser legal passar por várias locações icônicas da série Fatal Fury!
E outra franquia clássica da SNK digna de nota é o Samurai Shodown, né? Até porque recentemente vocês o trouxeram para o mobile, e eu conheço muita gente por aqui que adora emular jogos clássicos de luta no celular.
O jogo foi feito em parceria com a Netflix e eu particularmente fiquei muito surpreso com a qualidade. Eu já tinha me sentido assim com a versão de Nintendo Switch, é incrível ver tudo plenamente jogável nessas plataformas, a magia tecnológica disso me fascina.
Eu sei que o mercado mobile é muito importante por aqui, e eu vi muitos desenvolvedores se focando no mobile no país. Até mesmo porque aqui no Brasil eu sei que os impostos e taxas de importação são gigantescos.
Enquanto a Nintendo dominava todas as Américas nos anos 90, a SEGA conseguiu ser gigante aqui porque foram os primeiros espertos o suficiente para licenciar os seus produtos, produzindo localmente com taxas melhores. O Xbox também fez isso na década passada, então a gente entende a importância.
Uma das coisas que mais nos pedem no Samurai Shodown é o suporte a controles, então isso é algo que está nos planos para o futuro próximo.
E depois disso eu espero que as pessoas dêem uma chance ao jogo. Eu não sei os números de downloads na América Latina de cabeça, mas o mercado daqui é extremamente importante.
Tanto que em todas as entrevistas que eu fiz na BGS 2023, em algum ponto alguém perguntou sobre mobile. E com tanta popularidade, isso dá às pessoas uma chance de experimentarem os nossos jogos, nossas IPs, coisa que talvez não pudessem fazer pelo preço dos consoles.
Espero que no futuro a gente tenha ainda mais oportunidades e jogos desse tipo!
E falando em novas formas de jogar, já que você mencionou o suporte a controles, o que acha da implementação de controles modernos, como vistos no Street Fighter 6? O Project L também deve simplificar bastante os inputs, né? É um caminho sem volta?
Muita gente jovem começou a gostar de jogos de luta nos últimos anos e eles não possuem a mesma nostalgia que a gente, então eles não vêem nem sentido em usar Arcade Sticks, às vezes vão direto para o leverless.
Às vezes isso pode até causar confusão em torneios retrô, e é engraçado, porque por exemplo, lá no Japão, mais ou menos na época do lançamento de Street Fighter V para fliperamas, surgiu um novo padrão, sabia?
As máquinas mais modernas possuem portas USB para que você possa conectar o seu controle favorito. E aí isso motiva os jovens a irem até lá também.
Chegou a acontecer comigo quando eu fui ao Japão em 2016: um dos jogadores mais fortes de Guilty Gear do meu país viajou comigo porque ele queria se desafiar a jogar contra os mais fortes. Ele era muito forte no Chile, mas queria se comparar ao resto do mundo.
Mas já aí tivemos uma barreira, porque ele costumava jogar em consoles com controles, enquanto a maioria dos japoneses bons jogavam nos fliperamas. Isso tornou tudo muito difícil para ele. Felizmente, hoje em dia essa barreira já não existe mais, e isso gera uma boa oportunidade.
Eu prefiro que as pessoas possam jogar como quiserem e com o máximo de opções possíveis. A maior parte da molecada de hoje só joga online e nunca foram a um torneio real ao vivo.
Então vamos dizer que você esteja acostumado a jogar no teclado. Como você faria em um torneio ao vivo? Temos um jovem muito forte em KOF lá no Chile, ele ficou em nono lugar na EVO, mas ele joga no teclado, então ele teve que comprar um adaptador.
No fim, ele conseguiu jogar com o seu teclado no PlayStation 4 com seus reflexos e reações afiadas. Sem acessibilidade, ele não conseguiria fazer isso.
Espero que todos sempre tenham formas, modos e acessibilidade para mostrar as suas habilidades, porque isso ajuda a subir o nível dos jogos para todos.
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